sexta-feira, 19 de outubro de 2012

JARTURICE OU... JARTURADA - VI





(Problema 54)
TORNEIO DE PREPARAÇÃO
2.ª Problema
O AGENTE ÁLIBI
Original de: DR. ACÉFALO (V. N. GAIA)
 Publicado na secção POLICIÁRIO em: 18.Outubro.1992
        
Era um dia chuvoso. Apesar de serem frequentes as abertas, a atmosfera densa e sufocante deixava quem nela estivesse envolvido deprimido ou num estado de semiletargia. Claro que isto não deixava indiferente o agente Álibi que, independentemente das circunstâncias, se encontrava sempre numa espécie de hibernação, que só o aparecimento de um “caso” interrompia.
         Porém, naquele dia, Álibi parecia decidido a não se deixar afundar naquela cadeira. Abriu a gaveta a que normalmente os colegas chamavam “do entulho” e extraiu de um emaranhado de recortes de problemas de xadrez um baralho de cartas.
         Já ia a paciência avançada, quando ouviu os passos de Duplicado, dirigindo-se ao gabinete. Atabalhoadamente, juntou as cartas e meteu-as na gaveta. Duplicado entrou no gabinete:
         - Bem, Álibi… Esqueceu-se deste ás de espadas… Arrume melhor o baralho que meteu para aí e vamos em serviço.
         Chegaram ao escritório do dr. Mendes, um abastado notário que fora encontrado morto no seu compartimento com uma faca nas costas. Ao entrarem pela porta principal, o impacto não podia ser mais agradável, uma longa e extensa sala em L, em cujas paredes brancas ressaltavam as cores e formas difusas das serigrafias que nos faziam ser assaltados por reminiscências do nosso imaginário infantil. Três janelas amplas faziam-nos afastar a ideia de um escritório de notário soturno e austero.
         Enquanto Álibi, aparentemente alheio a tudo o que se passava, passeava os olhos por umas vitrinas onde estavam expostos documentos assinados pelo bisavô da vítima (o único elemento que ali expressava o carácter institucional da firma), Duplicato era guiado pelo chefe do pessoal e pela secretária do doutor até ao escritório do pessoal, através de uma porta cujo vidro translúcido permitia que alguma luz da sala de espera iluminasse um escritório sem qualquer janela.
         O escritório do pessoal e a sala de espera em L perfaziam um rectângulo. O escritório do pessoal, por sua vez, possuía uma porta que comunicava com o escritório privativo do dr. Mendes. Quanto ao resto do edifício, havia um pátio ao qual apenas era possível chegar por meio de uma porta da sala de espera e outra do escritório privativo.
         Ao entrarem na sala do pessoal, o barulho monocórdico e desgastante das máquinas de escrever cessou imediatamente. O chefe do pessoal avançou resolutamente para uma secretária onde se encontrava um homem extremamente apavorado.
                                                                                                                            
         - Ainda não compreendo o que aconteceu… É de dar em doido com tudo isto… Como ainda trabalho aqui há pouco tempo, tenho de ir frequentemente a outras secretárias para conseguir esclarecimentos e quando estava a ouvir o senhor Daniel, vi de repente… Garanto que vi, através da porta, um homem de fato e chapéu esfaquear o doutor.
         Duplicato olhou para a porta e verificou que possuía espelhos que não permitiam olhar para dentro.
         - Sabe, o senhor doutor era um pouco malicioso – continuou o chefe de pessoal – mandou pôr esses vidros porque tinha o prazer de fazer crer às pessoas que estavam permanentemente vigiadas.
         Entraram no escritório do doutor Mendes. Era um lugar triste, sem uma janela e cujas paredes eram forradas de poeirentos e volumosos livros. Na verdade, daquele escritório era possível ver o pessoal a trabalhar.
         - Bem, podemos atingir a sala de espera pelo pátio, não é verdade? – Era a primeira vez que Álibi abria a boca. Até ali tinha deambulado como uma alma penada, indiferente ao mundo exterior.
         - Sim. – Respondeu amavelmente a secretária, que abriu a porta do pátio, deixando o escritório ser invadido por uma magnífica luminosidade, deixando ver partículas de pó redemoinhando no ar.
         Ao chegarem à sala de espera, a secretária fê-los sentar na escrivaninha situada logo à direita da porta do pátio e onde recebia os clientes.
         - Durante a manhã esteve cá alguém? – Inquiriu Álibi.
         - Estiveram o doutor Francisco e o professor Gregório, mas como pude verificar, deixaram o doutor vivo e de boa saúde. Desde então, incluindo as horas mortas habituais, não vi cá ninguém.
         - Nem mesmo o senhor Alenquer?
         - Oh! O pessoal pode confirmar que estive lá toda a manhã. – Exclamou surpreendido e ferido na sua honra o Alenquer.      
         Álibi sorria… Era o primeiro caso que resolvera desde que fora “despromovido” a agente.

         - Quem parece estar irremediavelmente comprometido(a) com o crime?
         - Justifique a sua afirmação, descrevendo como tudo se terá passado?

Solução do  2.ª Problema
O AGENTE ÁLIBI
Original de: DR. ACÉFALO (V. N. GAIA)
Publicado na secção POLICIÁRIO em: 22.Novembro.1992
        
Comentário: Esta prova foi uma das que nasceram mal e portanto mal há-de morrer. Há coisas assim. Na realidade, não se registou no problema a necessária concretização e pormenorização, não tendo saído na sua versão integral, provocando duas situações curiosas: Por um lado, estragou-se um problema que, não sendo de enorme qualidade, poderia ser um bom exercício; por outro, originou um leque fabuloso de soluções, dentro daquela máxima que indica que quanto melhor é o problema piores são, de um modo geral, as soluções, e o inverso. Na realidade, perante um problema indefinido e não concretizado, os solucionistas, de um modo geral, lançaram-se ao que existia e fizeram soluções excelentes que só a falta de espaço nos impede de publicar.

Como muitos verificaram, a chave do problema relacionava-se com a porta espelhada e com as movimentações da secretária. O que falhou foi dizer-se que “a superfície espelhada funcionava pela variação de luminosidade” e portanto era sempre visível o que se passava no lado mais “iluminado”. Para começar o crime, a secretária disfarçada, com a sua conivência, abria a porta de acesso ao pátio, por onde entrava, como se diz no texto, 2uma magnífica luminosidade…”, o que iria inverter o lado visível e tornar possível q2ue o tal indivíduo fosse visto a matar o notário. Não sabemos se todas as superfícies espelhadas funcionam segundo este sistema, o que tornaria o problema correcto e inatacável, mesmo com a versão actual, mas foi-nos dito que existem espelhos de face única. Daí estes comentários e a justificação, também, para uma certa “benemerência” em termos de classificações.
Prometemos ser mais cuidadosos no futuro, pedindo desde já desculpas pelos transtornos causados.
                                                Luís Pessoa


NOTA do Jartur:

O texto que se segue, é um desabafo do autor, e deverá ser, por quem o desejar, excluído deste ficheiro.

Neste, nos anteriores e nos futuros trabalhos para o «AHPPP», ou para quaisquer outros fins, não utilizo, não utilizei nem utilizarei na escrita, as imposições daquilo a que chamam o “Novo Acordo Ortográfico”, porque não lhe encontro qualquer benefício, em relação à forma de ler e escrever, que aprendi dos professores e nos livros das escolas, e que fui aperfeiçoando e memorizando em mais de cinquenta anos de escrita criativa para diversas publicações, e na leitura e consulta de obras literárias e técnicas, bem como gramáticas, dicionários, léxicos e enciclopédias.
E mais vejo reforçada a minha teoria, quando ouço e vejo, na Rádio ou na Televisão, nos pretensos programas de ensino do Português, os “mestres” dizerem aos «espetadores» que é assim, mas que também se pode optar pela grafia anterior. Tanto faz assim… como assado.
Eu fico-me pelo assado… estou «velho” para novas ementas!...

É evidente, porém, que não deixarei de cometer alguns erros e descuidos involuntários, dos quais desde já me penitencio.
Perdoem-me, pois, os leitores discordantes. A esses, assiste-lhes o direito de ignorar o que aprenderam antes.
                                               
E, já agora…
No entanto, na transcrição de textos actuais ou antigos, qualquer que seja o Acordo Ortográfico em vigor na época da sua criação, respeitarei a escrita do autor, ainda que tenha que escrever Pharmácia.

                                        Jartur


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