domingo, 14 de setembro de 2014

POLICIÁRIO 1206

[Transcrição da secção n.º 1206 publicada 
hoje no jornal PÚBLICO]


A HISTÓRIA DE UMA HERANÇA DAS ARÁBIAS

O nosso confrade Verbatim apresenta-nos um testamenteiro arguto para resolver uma herança bem ao jeito das arábias onde os camelos ainda têm valor…

CAMPEONATO NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL - 2014
PROVA N.º 8 – PARTE II
“MAGIA COM CAMELOS” – Original de VERBATIM

Esta é uma história das Arábias relativa a uma herança e a um testamenteiro que ajudou a resolver um caso bicudo.
Hassan, vendo a morte a aproximar-se, tratou de redigir um testamento. Naquele tempo e naqueles sítios, uma pessoa podia distribuir a herança por quem quisesse e o que não fosse distribuído revertia para a tribo. Feito o testamento, Hassan chamou os seus três filhos e o vizinho Omar, que nomeou como testamenteiro e a quem entregou aquele documento, que previamente fechara e selara, com a indicação de que só deveria ser aberto no dia seguinte ao seu falecimento. E este ocorreu poucas semanas depois. Descerrado o testamento, verificou-se que Hassan determinara que o seu património, constituído por 11 camelos praticamente iguais, deveria ser assim dividido: metade para o filho mais velho, um quarto para o do meio e um sexto para o mais novo.
Não sendo possível dividir os onze camelos em conformidade com o estipulado no testamento, sem partir algum camelo aos bocados, os três irmãos procuraram uma saída para a dificuldade mas não a encontraram. Lembraram-se então de recorrer a Omar. Este disse que lhes solucionaria o problema a contento, mas pediu que lhe dessem, como comissão, aquilo que recebessem a mais do que Hassan lhes destinara, convertida em dinheiro essa parte excedente ao valor médio dos camelos no mercado de Medina. Os três irmãos não compreenderam muito bem a sugestão de Omar, mas tendo verificado que nada perderiam, acabaram por aceitar a proposta.
Então Omar foi buscar um dos seus camelos e juntou-o à cáfila deixada por Hassan. Ficaram, portanto, 12 camelos. Depois, entregou seis animais (metade de doze) ao filho mais velho, três animais (uma quarto de doze) ao do meio e dois animais (um sexto de doze) ao mais novo. E, como os três irmãos ficaram com onze camelos (6+3+2=11), retirou o camelo que trouxera de início e que não fazia parte da herança.
Maravilha!     Os irmãos ficaram encantados e logo ali trataram de liquidar as contas com o testamenteiro, uma vez que, com aquele oportuno empréstimo feito por Omar, todos eles receberam um pouco mais do que esperavam. O filho mais velho, por exemplo, que tinha direito a 5,5 camelos, recebeu seis. Não teve, portanto, pejo em pagar metade do valor de um camelo a Omar, honrando o acordo firmado. Os outros irmãos pagaram também os respectivos excedentes. E tudo acabou na maior das harmonias.
Um primo daqueles três irmãos, entretanto regressado de Meca, depois de ouvir a história, produziu um comentário bem ajustado ao que se passara. Veja se consegue descobri-lo entre os quatro seguintes que nos chegaram:
1 – Omar é um homem muito arguto que conseguiu resolver um problema bicudo de uma maneira inteiramente justa.
2 – O que Omar recebeu como comissão saiu de algo de que os três filhos não podiam dispor.
3 - Omar usou uma técnica matemática utilizada, por vezes, na divisão ponderada de heranças, mas que introduz pequenas distorções.
4 - Omar arranjou maneira de ficar com parte da herança que Hassan destinara aos três filhos sem que estes se sentissem lesados.

E pronto.
Resta aos nossos “detectives” enviarem as propostas de solução do enigma, impreterivelmente até ao próximo dia 5 de Outubro, para o que poderão usar um dos seguintes meios:
- Pelos Correios para Luís Pessoa, Estrada Militar, 23, 2125-109 MARINHAIS;
- Por e-mail para um dos endereços:
- Por entrega em mão ao orientador da secção, onde quer que o encontrem.
Boas deduções!

SOLUÇÃO DA PROVA N.º 6 – PARTE II
“ROUBARAM A GIOCONDA”, de BÚFALOS ASSOCIADOS


A resposta certa é: B - O Sr. Lopes deve ter mentido.
O problema remete a acção para tempo de castanhas e temporal (Inverno portanto) nos anos em que o Benfica jogou no seu (emprestado pelo Sporting...) Campo Grande, conhecido por "a estância de madeiras", de 1941 até 1953.
A hipótese D fica desde logo eliminada, pois se a chave roubada apareceu em cima do balcão do café e a porta da rua estava fechada com duas voltas, é porque alguém que possuía a sua própria chave a terá fechado por fora. Um dos quatro que tinham chave mentiu e deve ter sido quem levou a gata, ficando desde já posta de parte a hipótese de um ladrão desconhecido, pois entre sábado à tarde e domingo de manhã não teria sido fácil, naquela época, alguém mandar fazer um duplicado da chave roubada. Mas, sendo alguém do prédio, para quê roubar outra chave quem já possuía uma? É o que veremos mais tarde.
A Dona Rosa estará ilibada pelo testemunho da prima e a atitude da Elsa parece sincera. Acontece que os depoimentos são mais ou menos credíveis, à excepção de um. Não parece nada normal que, num dia de temporal desfeito sobre Lisboa com ventos ciclónicos e chuva sem parar, o Sr. Lopes, um homem já velhote e que pouco saía de casa, tenha estado a pescar na doca do Poço do Bispo desde as dez da manhã até perto das três da tarde. Daí que as desconfianças do Inspector Garrett se tenham inclinado para ele. Ainda por cima, com a corrida que terá dado para a porta, mostrou uma preocupação de não se molhar que não joga com a afirmação de ter estado mais de quatro horas à pesca em pleno temporal.
A acreditarmos no que disseram a Elsa e o Leonardo, o roubo deve ter-se dado entre as 11 horas e as duas da tarde. O Lopes, que segundo parece detestava a Gioconda, deve ter aproveitado o facto de ser domingo (dia em que o café estava fechado, Leonardo costumava ir vender castanhas, a Elsa não trabalhava e a Dona Rosa ia normalmente à missa) para proceder à execução sumária do felino. Na véspera à tarde ter-se-á apoderado da chave suplente com a intenção de deitar as culpas para alguém de fora. Estava ali mesmo à mão pendurada na ombreira da porta, qualquer um a tirava, e abandonada no balcão acusaria outro qualquer que não ele, que tinha a sua própria chave. Mas com a atrapalhação de fugir levando ao colo o animal odiado, deve ter-se distraído e fechou a porta com duas voltas, como a encontrou. Se a tivesse deixado no trinco, ainda seria possível desconfiar de um estranho, mas assim não. Em vez da pesca ao robalo, foi a caça à gata, que acabou na caça ao Lopes. E a relação entre os dois homens nunca mais foi a mesma. Mas a verdade é que o Vale Escuro também já não é o mesmo.

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